Para novo vice-presidente do STF, o ex-presidente foi tirânico e incendiou Judiciário
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BRASÍLIA - Dois dias depois de ser chamado de inseguro e dono de
"temperamento difícil" pelo ministro Cezar Peluso, o ministro do Supremo
Tribunal Federal Joaquim Barbosa respondeu em tom duro. Em entrevista
ao GLOBO, Barbosa chamou o agora ex-presidente do STF de "ridículo",
"brega", "caipira", "corporativo", "desleal", "tirano" e "pequeno".
Acusou Peluso de manipular resultados de julgamentos de acordo com seus
interesses, e de praticar "supreme bullying" contra ele por conta dos
problemas de saúde que o levaram a se afastar para tratamento. Barbosa é
relator do mensalão e assumirá em sete meses a presidência do STF,
sucedendo a Ayres Britto, empossado nesta quinta-feira. Para Barbosa,
Peluso não deixa legado ao STF: "As pessoas guardarão a imagem de um
presidente conservador e tirânico, que não hesitava em violar as normas
quando se tratava de impor à força a sua vontade."
- O
GLOBO: Ao deixar o cargo, o ex-presidente do STF, ministro Cezar
Peluso, deu entrevista na qual citou o senhor. Em um dos momentos, diz
que o senhor não recusará a presidência do tribunal em circunstância
alguma. É verdade?
JOAQUIM BARBOSA: Para
mim, assumir a presidência do STF é uma obrigação. Tenho feito o
possível e o impossível para me recuperar consistentemente e chegar bem
em dezembro para assumir a presidência da Corte. Mas, para ser sincero,
devo dizer que os obstáculos que tive até agora na busca desse objetivo,
lamentavelmente, foram quase todos criados pelo senhor... Cezar Peluso.
Foi ele quem, em 2010, quando me afastei por dois meses para tratamento
intensivo em São Paulo, questionou a minha licença médica e, veja que
ridículo, aventou a possibilidade de eu ser aposentado compulsoriamente.
Foi ele quem, no segundo semestre do ano passado, após eu me submeter a
uma cirurgia dificílima (de quadril), que me deixou vários meses sem
poder andar, ignorava o fato e insistia em colocar processos meus na
pauta de julgamento para forçar a minha ida ao plenário, pouco
importando se a minha condição o permitia ou não.
O senhor tomou alguma providência?
BARBOSA:
Um dia eu peguei os laudos descritivos dos meus problemas de saúde,
assinados pelos médicos que então me assistiam, Dr. Lin Tse e Dr.
Roberto Dantas, ambos de São Paulo, e os entreguei ao Peluso, abrindo
mão assim do direito que tenho à confidencialidade no que diz respeito à
questão de saúde. Desde então, aquilo que eu qualifiquei jocosamente
com os meus assessores como “supreme bullying” vinha cessando. As
fofocas sobre a minha condição de saúde desapareceram dos jornais.
Qual a opinião do senhor sobre a entrevista dada por Cezar Peluso?
BARBOSA: Eis que no penúltimo dia da sua desastrosa presidência, o senhor Peluso, numa demonstração de “désinvolture”
brega, caipira, volta a expor a jornalistas detalhes constrangedores do
meu problema de saúde, ainda por cima envolvendo o nome de médico de
largo reconhecimento no campo da neurocirurgia que, infelizmente, não
faz parte da equipe de médicos que me assistem. Meu Deus! Isto lá é
postura de um presidente do Supremo Tribunal Federal?
O ministro Peluso disse na entrevista que o tribunal se apaziguou na gestão dele. O senhor concorda com essa avaliação?
BARBOSA:
Peluso está equivocado. Ele não apaziguou o tribunal. Ao contrário, ele
incendiou o Judiciário inteiro com a sua obsessão corporativista.
Na visão do senhor, qual o legado que o ministro Peluso deixa para o STF?
BARBOSA:
Nenhum legado positivo. As pessoas guardarão na lembrança a imagem de
um presidente do STF conservador, imperial, tirânico, que não hesitava
em violar as normas quando se tratava de impor à força a sua vontade.
Dou exemplos: Peluso inúmeras vezes manipulou ou tentou manipular
resultados de julgamentos, criando falsas questões processuais
simplesmente para tumultuar e não proclamar o resultado que era
contrário ao seu pensamento. Lembre-se do impasse nos primeiros
julgamentos da Ficha Limpa, que levou o tribunal a horas de discussões
inúteis; não hesitou em votar duas vezes num mesmo caso, o que é
absolutamente inconstitucional, ilegal, inaceitável (o ministro se
refere ao julgamento que livrou Jader Barbalho da Lei da Ficha Limpa e
garantiu a volta dele ao Senado, no qual o duplo voto de Peluso,
garantido no Regimento Interno do STF, foi decisivo. Joaquim discorda
desse instrumento); cometeu a barbaridade e a deslealdade de, numa curta
viagem que fiz aos Estados Unidos para consulta médica, “invadir” a
minha seara (eu era relator do caso), surrupiar-me o processo para poder
ceder facilmente a pressões...
Quando o senhor assumir a
presidência, pretende conduzir o tribunal de que forma? O senhor acha
que terá problemas para lidar com a magistratura e com advogados?
BARBOSA: Nenhum problema. Tratarei todos com urbanidade, com equidade, sem preferências para A, B ou C.
O
ministro Peluso também chamou o senhor de inseguro, e disse que, por
conta disso, se ofenderia com qualquer coisa. Afirmou, inclusive, que o
senhor tem reações violentas. O senhor concorda com essa avaliação?
BARBOSA:
Ao dizer que sou inseguro, o ministro Peluso se esqueceu de notar algo
muito importante. Pertencemos a mundos diferentes. O que às vezes ele
pensa ser insegurança minha, na verdade é simplesmente ausência ou
inapetência para conversar, por falta de assunto. Basta comparar nossos
currículos, percursos de vida pessoal e profissional. Eu aposto o
seguinte: Peluso nunca curtiu nem ouviu falar de The Ink Spots (grupo norte-americano de rock e blues da década de 1930/40)! Isso aí já diz tudo do mundo que existe a nos separar...
O
senhor já protagonizou algumas discussões mais acaloradas em plenário,
inclusive com o ministro Gilmar Mendes. Acha que isso ocorreu devido ao
seu temperamento ou a outro fator?
BARBOSA:
Alguns brasileiros não negros se acham no direito de tomar certas
liberdades com negros. Você já percebeu que eu não permito isso, né? Foi
o que aconteceu naquela ocasião.
O senhor tem medo de ser
qualificado como arrogante, como o ministro Peluso disse? Tem receio de
ser qualificado como alguém que foi para o STF não por méritos, mas
pela cor, também conforme a declaração do ministro?
BARBOSA:
Ao chegar ao STF, eu tinha uma escolaridade jurídica que pouquíssimos
na história do tribunal tiveram o privilégio de ter. As pessoas
racistas, em geral, fazem questão de esquecer esse detalhezinho do meu
currículo. Insistem a todo momento na cor da minha pele. Peluso não
seria uma exceção, não é mesmo? Aliás, permita-me relatar um episódio
recente, que é bem ilustrativo da pequenez do Peluso: uma universidade
francesa me convidou a participar de uma banca de doutorado em que se
defenderia uma excelente tese sobre o Supremo Tribunal Federal e o seu
papel na democracia brasileira. Peluso vetou que me fossem pagas diárias
durante os três dias de afastamento, ao passo que me parecia evidente o
interesse da Corte em se projetar internacionalmente, pois, afinal, era
a sua obra que estava em discussão. Inseguro, eu?
O senhor considera que Peluso tratou seu problema de saúde de forma desrespeitosa?
BARBOSA: Sim.
O senhor sofre preconceito de cor por parte de seus colegas do STF? E por parte de outras pessoas?
BARBOSA:
Tire as suas próprias conclusões. Tenho quase 40 anos de vida pública.
Em todos os lugares em que trabalhei sempre houve um ou outro
engraçadinho a tomar certas liberdades comigo, achando que a cor da
minha pele o autorizava a tanto. Sempre a minha resposta veio na hora,
dura. Mas isso não me impediu de ter centenas de amigos nos quatro
cantos do mundo.
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20/04/2012-14h34
Eliane Cantanhêde: Alta corte está em pé de guerra
DE BRASÍLIA
O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Cezar Peluso declarou recentemente ao site "Consultor Jurídico" que o colega de tribunal Joaquim Barbosa era "inseguro e temperamental", além de ceder às pressões populares em seus julgamentos.
A resposta de Barbosa veio hoje, após uma entrevista ao jornal "O Globo".
O magistrado afirmou que Peluso era "ridículo", "brega", "caipira", "corporativista", "desleal", "tirano" e "pequeno", além de manipulador de resultado dos julgamentos.
"Como saberemos quem tem razão?", questiona Eliane Cantanhêde, colunista da Folha.com.
No áudio abaixo, a jornalista fala sobre o pé de guerra dentro da mais alta corte brasileira, e destaca que é justamente nesse ambiente que os ministros prometem votar, ainda esse ano, o mensalão, maior escândalo do governo Lula.
http://www1.folha.uol.com.br/multimidia/podcasts/1078943-eliane-cantanhede-alta-corte-esta-em-pe-de-guerra.shtml
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