15 de jun. de 2011

Entrevista - Joaquim Barbosa

REVISTA VEJA | ENTREVISTA (17 a 21)
STF | SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL



Nos últimos seis meses, o ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal, perdeu 9 quilos. Ele cortou as massas e aumentou a quantidade de verduras no prato – em mais uma tentativa de arrefecer as dores na coluna, problema de saúde que o persegue há anos. Aos 56 anos de idade, o ministro também carrega sobre os ombros a pesada responsabilidade de relatar o processo do mensalão – o maior escândalo de corrupção da história brasileira, que tanto pode levar a cadeia figurões da política, o que seria um fato inédito, como também pode ajudar a consolidar o descrédito na Justiça, confirmando a máxima de que poderosos e prisão percorrem caminhos paralelos. Em entrevista a Veja, Joaquim Barbosa, que deve assumir a presidência da Corte no fim do ano que vem, se diz formalmente impedido de comentar o caso do mensalão. Por outro lado, o ministro deixa clara a sua preocupação com as barreiras criadas pela própria legislação brasileira com o objetivo, segundo ele, de inviabilizar a punição de políticos corruptos.

Veja – O protagonismo do STF dos últimos tempos tem usurpado as funções do Congresso?
Joaquim Barbosa – Temos uma Constituição muito boa, mas excessivamente detalhista, com um número imenso de dispositivos e, por isso, suscetível a fomentar interpretações e toda sorte de litígios. Também temos um sistema de jurisdição constitucional, talvez único no mundo, com um rol enorme de agentes e instituições dotadas da prerrogativa ou de competência para trazer questões ao Supremo. É um leque considerável de interesses, de visões, que acaba causando a intervenção do STF nas mais diversas questões, nas mais diferentes áreas, inclusive dando margem a esse tipo de acusação. Nossas decisões não deveriam passar de 200, no máximo 300 por ano. Hoje, são analisados 50.000, 60.000 processos. É uma insanidade.

Veja – Qual é a consequência direta dessa sobrecarga? Joaquim – O pouco tempo de que dispomos para estudar e refletir sobre as questões verdadeiramente importantes, como anencefalia, ficha limpa, células-tronco, homoafetividade, regime de cotas raciais na educação. Estes, sim, são casos apropriados para uma Corte como o Supremo Tribunal Federal. Hoje, consumimos boa parte do nosso tempo julgando ações que não precisariam chegar aqui.

Veja – O senhor pode dar um exemplo?
Joaquim – Julguei o caso de um homem que foi processado criminalmente porque deu um chute na canela da sogra. Ele foi condenado e ingressou com um habeas corpus que veio parar aqui. Parece brincadeira, mas isso é recorrente.

Veja – Há vários diagnósticos sobre o tema. Para o senhor, por que a Justiça no Brasil é tão lenta?
Joaquim – Os processos demoram muito porque as leis são muito intricadas, malfeitas. As leis não foram pensadas para dar solução rápida aos litígios. É um problema cultural, de falta de sentido prático para resolver as coisas. Deveríamos nos espelhar um pouco na Justiça americana, na rapidez com que ela resolve a maioria dos casos. Se um sistema judiciário não dá resposta rápida às demandas de natureza econômica, de natureza criminal, ele produz evidentemente uma descrença, um desânimo, que atingem a sociedade como um todo, inibindo investidores e empreendedores.

Veja - Essa percepção vem do exercício da magistratura?
Joaquim – O país atravessa um excelente momento econômico. Tenho amigos no exterior que dizem que há muita gente querendo investir no Brasil. Ao chegarem aqui, porém, essas pessoas depararam com um emaranhado de problemas de ordem legal, que vai da emissão do visto de permanência à criação de uma empresa. São muitos obstáculos. Veja – Esse emaranhado legal também está entre as causas da impunidade? Joaquim – A Justiça solta porque, muitas vezes, a decisão de prender não está muito bem fundamentada. Os elementos que levaram à prisão não são consistentes. A polícia trabalha mal, o Ministério Público trabalha mal. Na maioria dos casos que resultam em impunidade, é isso que ocorre. Por outro lado, o sistema penal brasileiro pune – e muito... principalmente os negros, os pobres, as minorias em geral. Às vezes, de maneira cruel, mediante defesa puramente formal ou absolutamente ineficiente.

Veja – O senhor concorda, então, com a ideia generalizada de que os poderosos não vão para a cadeia? Joaquim – O foro privilegiado, como o nome já diz, reflete bem essa distinção cruel que não deveria existir. Uma vez eu chamei atenção para isso aqui no plenário do tribunal. Você se lembra quando o presidente Bill Clinton foi inquirido pelo Grand Jury? O que é um Grand Jury nos Estados Unidos? Nada mais que um órgão de primeira instância, composto de pessoas do povo. Era o presidente dos Estados Unidos comparecendo perante esse júri, falando sob juramento, sem privilégio algum. O mais poderoso do planeta submetendo-se às mesmas leis que punem o cidadão comum. O foro privilegiado é a racionalização da impunidade.

Veja – Como assim?
Joaquim – A criação do foro privilegiado foi uma aposta que se fez na impossibilidade de os tribunais superiores levarem a bom termo um processo judicial complexo. Pense bem: um tribunal em que cada um dos seus componentes tem 10.000 casos para decidir, e cuja composição plenária julga questões que envolvem direitos e interesses diretos dos cidadãos, pode se dedicar às minúcias características de um processo criminal? Não é a vocação de uma corte constitucional. Isso foi feito de maneira proposital.

Veja -Para garantir impunidade? Joaquim – Evidente. O foro privilegiado foi uma esperteza que os políticos conceberam para se proteger. Um escudo para que as acusações formuladas contra eles jamais tenham consequências.

Veja – E, pelos exemplos recentes, parece que tem realmente funcionado. Político na cadeia? Joaquim –Vai demorar muito ainda para que se veja um caso. Um processo criminal, por colocar em jogo a liberdade de uma pessoa em única e última instância, tem de ser um processo feito com a máxima atenção. É difícil conciliar esse rol gigantesco de competências que o Supremo tem com a condução de um processo criminal. Coordenar a busca de provas, determinar medidas de restrição à liberdade, invasivas da intimidade, são coisas delicadíssimas. Veja – Esse raciocínio que o senhor acaba de fazer se aplica ao caso do mensalão? Joaquim – Não vou falar sobre isso. Esse é um processo que está em andamento, está sob os meus cuidados e, por isso, estou impedido de falar sobre ele.

Veja – O senhor é o primeiro ministro negro do STF. Qual é a sua opinião sobre as políticas afirmativas?
Joaquim – Em breve, o Supremo vai se posicionar sobre a questão das cotas raciais. Não posso me antecipar sobre um tema que ainda está sob análise. O que posso dizer é que existem experiências bem-sucedidas no mundo, mas isso não significa necessariamente que a receita possa ser copiada no Brasil. Não é um tema simples, mas é extremamente relevante.

Veja – O senhor concorda com a forma como são escolhidos os ministros das cortes superiores?
Joaquim – Não é o sistema ideal, mas não vislumbro outro mehor. Há os que criticam essa prerrogativa do presidente da República, mas acho que ele carrega consigo representatividade e legitimidade para isso. Qual seria a alternativa a esse sistema? A nomeação pelo Congresso? Seguramente essa alternativa teria como consequência inevitável o rebaixamento do Supremo a um cabide de empregos para políticos sem voto, em fim de carreira, como ocorre com o Tribunal de Contas da União. Muita gente defende que se deva outorgar a escolha ao próprio Judiciário. Mas, com certeza, essa também não seria uma alternativa eficaz. Um corporativismo atroz se instalaria. Talvez, como ideia, poderíamos pensar em estabelecer um prazo fixo para o mandato dos ministros dos tribunais superiores.

Veja – Quais seriam os méritos dessa ideia de encurtar a vida útil dos ministros?
Joaquim – É sempre uma aventura institucional mudar subitamente a forma de funcionamento de um órgão que já tem 120 anos de vida e que, bem ou mal, é a mais estável das nossas instituições. Mas penso que pode haver ganhos no estabelecimento de mandatos, com duração fixa, de doze anos, por exemplo, sem renovação. Mandatos curtos trariam insegurança e suscitariam a discussão sobre a possibilidade de renovação, o que não seria bom.

Veja – Da maneira como é feita hoje, a escolha dos ministros pelo presidente da República não leva a um comportamento submisso ao Executivo?
Joaquim – No Brasil de hoje não vejo nenhuma submissão do Judiciário ao Executivo. Nenhuma. O Judiciário brasileiro tem todas as garantias, todas as prerrogativas para ser um dos mais independentes do mundo. Nem mesmo os Estados Unidos contam com as nossas prerrogativas. As garantias da Constituição mudaram radicalmente a face do Poder Judiciário, que saiu de uma situação de invisibilidade, antes de 1998, para essa enorme visibilidade atual. O problema do Judiciário é de outra ordem, é organizacional, no plano da lei. Falta ousadia, falta coragem de propor mudanças que tornem a prestação jurisdicional mais rápida e pragmática.

Veja – A Justiça é tarda e falha no Brasil por quais razões? Joaquim – É absurdo um sistema judiciário que conta com quatro graus de jurisdição! Deveriam ser apenas duas instâncias, como é no mundo inteiro. Essas instâncias favorecem o excesso de recursos. Faz sentido em um país do tamanho do Brasil ter um sistema judicial em que tanto a Justiça Federal quanto a Justiça dos Estados tenham como órgãos de cúpula das suas decisões duas cortes situadas na capital federal, uma com 11 ministros e outra com 33? Bastaria uma. Em vez de termos duas cortes superiores para a Justiça comum, o Supremo e o Superior Tribunal de Justiça, em Brasília, poderíamos ter pequenas cortes, de no máximo sete juízes, em cada Estado. Uma estrutura mínima que pulverizaria o trabalho do Superior Tribunal de Justiça. Só viriam para o Supremo os processos que tratassem de questões verdadeiramente constitucionais. Essa seria a maneira correta de o sistema funcionar.

Veja – Então o senhor é a favor da proposta que prevê a execução imediata das decisões judicais após o pronunciamento dos tribunais de segunda instância?
Joaquim – O Brasil precisa urgentemente de um sistema judicial que dê respostas rápidas às demandas do cidadão por Justiça. Repito: não há como obter essas respostas rápidas com um sistema judicial com quatro graus de jurisdição. Isso é patético! Eu desafio qualquer um a me apontar uma única democracia minimamente funcional em que sejam necessárias quatro instâncias, que permitem dezenas de recursos, para que as decisões dos juízes, por mais singelas que sejam, tenham efetividade.

Veja – O governo pretende flexibilizar a legislação para facilitar as compras e contratações para as obras da Copa do Mundo. Assunto, que provavelmente, vai acabar ocasionando um processo no STF. O que o senhor acha dessa saída?
Joaquim – Sou contra abrir exceções para a Fifa. A Fifa é uma organização privada que não presta contas a ninguém. Eu adoro futebol, mas as exigências que estão sendo feitas pela Fifa para organizar o Mundial no Brasil me parecem exorbitantes. Esse é mais um caso que não precisaria chegar ao Supremo.

Veja – O STF confirmou na semana passada, inclusive com o voto do senhor a favor, a legalidade da decisão do ex-presidente Lula de não extraditar o terrorista Cesare Battisti. O Brasil não ocorre o risco de virar refúgio de criminosos?
Joaquim – O que tenho a dizer sobre este caso está detalhado no meu voto. Não tenho nada a acrescentar
Do site do CNJ.

14 de jun. de 2011

Ipea: negros estão mais sujeitos à mortalidade, e preconceito ainda é grande

PESQUISA »Ipea: negros estão mais sujeitos à mortalidade, e preconceito ainda é grande

Publicação: 15/05/2011 08:06
O Imparcial - Ma

Os negros são maioria no Brasil, mas ainda são os mais pobres e estão mais expostos à mortalidade por causas externas, principalmente homicídios.
Esta é a conclusão da pesquisa sobre a "Dinâmica Demográfica da População Negra Brasileira" realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). 
Os dados foram divulgados na véspera do dia 13 de maio, data que marca a Abolição da Escravatura no Brasil e também o Dia Nacional de Denúncia Contra o Racismo.


Entre os dados destacados pela pesquisa está o aumento da população negra que pulou de cerca de 75 milhões, em 2000, para 97 milhões, em 2010. O número superou a quantidade de brancos registrada em 91 milhões e que, desde as pesquisas censitárias na década de 1980, era a maioria populacional. 

De acordo com o Ipea, a mudança pode ter ocorrido por dois motivos: pela fecundidade mais elevada encontrada entre as mulheres negras ou um possível aumento dos que se declararam negros ou pardos no último censo. 
Esse sentimento de assumir a negritude é destacado por pesquisadores como um dos fatores importantes do combate ao racismo no Brasil e da implantação de políticas afirmativas para negros. O antropólogo maranhense Carlos Benedito Silva, mais conhecido como Carlão, avisa que existe a necessidade de criar mais referências positivas sobre os negros. "A imagem construída em nossa sociedade sobre o negro é da inferioridade, da incapacidade.
Com a luta dos movimentos sociais e uma exposição de artistas, atores e intelectuais negros, forma-se uma nova referência", explica.
 

Decreto sobre cotas para negros e índios em concursos no Rio cria polêmica entre os especialistas

RIO - O decreto que cria cotas para negros e índios em concursos públicos no Estado do Rio cria polêmica entre os especialistas do segmento - atingidos diretamente pela medida, que pode fazer com que pessoas com notas mais baixas sejam aprovadas. Publicado no Diário Oficial de terça-feira, dia 7, O decreto nº 43.007, do governador Sérgio Cabral (PMDB), reserva 20% das vagas em seleções para pessoas dessas raças nos quadros do Poder Executivo e das entidades da administração indireta do Rio de Janeiro.

Para Paulo Estrella, diretor do curso preparatório Academia do Concurso, a norma desequilibra o processo democrático do concurso e quem acaba perdendo são os candidatos que não se enquadram nas cotas e o próprio serviço público, que deixa de ter ingressando em seus quadros os candidatos melhor preparados.

- A medida resolve estatisticamente o acesso da população negra e indígena ao funcionalismo público, mas não atua sobre a base da questão. O sistema de cotas não corrige o desvio na origem - considera Estrella.

Segundo ele, apesar da dívida histórica que o país tem com negros e índios, quem necessita de apoio não é a totalidade dessa população e sim uma parcela pobre que não teve acesso a um ensino de qualidade e acaba ficando à margem do mercado de trabalho.

- Os negros com condições econômicas de ter um ensino de qualidade não têm necessidade de cotas. Por outro lado, as populações carentes, independentemente da cor da pele, têm grandes dificuldades de se posicionar no mercado de trabalho e também de serem aprovados em concursos públicos por causa da baixa qualidade de ensino das escolas públicas.

O professor Ernani Pimentel, presidente da Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac) acrescenta que o percentual de cotas não corresponde ao percentual de negros e índios no estado do Rio e ainda discrimina os brancos e os de origem asiáticas mais pobres, o que, a seu ver, configuraria outra injustiça.

- Os (negros e índios) que iriam preencher as cotas seriam os mais bem preparados e de melhor nível econômico, e, por isso mesmo, não precisariam delas - ressalta Pimentel.
Seguindo a mesma linha de Estrella e de Pimentel, o professor Ricardo Ferreira, autor do livro 'Manual dos Concurseiros' e criador da Feira do Concurso, acredita que o sistema de cotas sociais funcionaria melhor neste caso, já que poderiam também ser contemplados estudantes da rede pública e pessoas com comprovada baixa renda.

- Provavelmente esse sistema de cotas sociais acabaria por beneficiar, em sua maioria, negros, índios e outros grupos que, historicamente, não têm acesso aos cargos públicos em igualdade de condições por dificuldades econômicas.
Já Sérgio Camargo, advogado especializado em concursos, acredita que atrelar o acesso destas culturas simplesmente por sua origem étnica seria pouco objetivo, levando em consideração a realidade brasileira. Uma ideia é que as cotas valessem a partir da demonstração dos últimos impostos de renda, que comprovem a hipossuficiência, além de incluir aqueles candidatos que comprovassem período de três anos, por exemplo, nas escolas públicas municipais.

Para Estrella, a verdadeira origem do problema é a qualidade do ensino público. Caso este tivesse a mesma qualidade do ensino privado, todos, independente da cor da pele, do nível econômico e social, teriam as mesmas condições de ingressar na carreira pública.

- De que adianta corrigir as estatísticas com as cotas se nada fazemos com a origem do problema? Este se perpetua junto com as cotas. O problema do ingresso foi corrigido pelas cotas, que viraram muleta para a população que as utiliza. Quando haverá a cura para o problema, quando tiraremos as muletas e deixaremos essa população caminhar sozinha? - questiona o professor.

Ferreira, por sua vez, conclui que qualquer que seja o critério adotado para reserva de vagas será um paliativo. Ele concorda que a solução do problema passa por investimentos na educação, principalmente no ensino de base.

O decreto assinado pelo governador do Rio entra em vigor em um mês e vigorará por dez anos. Caberá à Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos acompanhar e elaborar relatórios sobre os resultados da iniciativa. A medida não vale para os concursos cujos editais já tenham sido publicados.


Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/economia/boachance/mat/2011/06/09/decreto-sobre-cotas-para-negros-indios-em-concursos-no-rio-cria-polemica-entre-os-especialistas-924650064.asp#ixzz1PIq7Bk36
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TEMA EM DISCUSSÃO: O ALCANCE DAS COTAS RACIAIS

 

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TEMA EM DISCUSSÃO:

O ALCANCE DAS COTAS RACIAIS

 

 

OPINIÃO:  EDSON SANTOS - Identidade com a cor

 Publicada em 13/06/2011 às 19h38m

 

 


A população brasileira deixou de ser majoritariamente branca, segundo o Censo 2010. É notícia animadora, pois indica a elevação da autoestima do povo durante a última década. O aumento no percentual de pretos e pardos não foi registrado só entre os mais jovens, mas também nos segmentos etários intermediários, demonstrando claramente um sentimento de pertencimento e de maior identificação do cidadão com a cor de sua pele. Essa mudança se explica pelo sucesso das políticas e iniciativas, públicas e privadas, para promover a igualdade de direitos e oportunidades entre os segmentos étnicos da população.

A cara da nova classe média é negra, e o mercado já acordou para este fato. No entanto, embora essas transformações estejam ocorrendo de forma semelhante em outros níveis e itens da vida nacional, a diferença que separa negros e brancos no Brasil ainda se traduz em índices de enorme desigualdade. Neste sentido, é revelador o Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil - 2009/ 2010, organizado pelo professor Marcelo Paixão e divulgado pela UFRJ.

O documento mostra que a população negra brasileira está em desvantagem no acesso a serviços públicos, como educação, saúde, justiça e previdência social, recebe uma menor renda e tem uma expectativa de vida mais baixa do que outros segmentos. As raízes desta situação são históricas. Pois a mudança da categoria de escravos para a de homens e mulheres livres, em 13 de maio de 1888, não foi capaz de alterar o quadro de exclusão da população negra, na medida em que não veio acompanhada da garantia de acesso à terra, ao trabalho, à saúde e à educação.

Ainda hoje, mais de 120 anos após a Abolição, a fragilidade socioeconômica do segmento é notável. Não é por acaso que os negros são maioria entre os beneficiários do Bolsa Família, e que, de acordo com o Censo, representem 70% das pessoas que sobrevivem em situação de extrema pobreza. Estas constatações apontam a necessidade de aprofundar e dar sustentabilidade às políticas de promoção da igualdade racial, que devem ser tomadas com o objetivo de tornar os extratos elevados da pirâmide social mais permeáveis à presença de pretos e pardos.

O foco dessas políticas, conhecidas como ações afirmativas, deverá estar voltado principalmente para a Educação e a qualificação para o trabalho. Dessa forma será possível mudar o quadro das relações raciais no Brasil. O Programa Universidade para Todos (ProUni), a adoção de cotas raciais em universidades públicas e a progressiva valorização da matriz cultural negra no sistema educacional brasileiro são medidas importantes, mas é preciso muito mais.

Além do amplo reconhecimento da gravidade da questão racial que atinge a maioria de nossa população, pela primeira vez na história do país temos formalizado, no Estatuto da Igualdade Racial, o direito a ações afirmativas. O desafio é materializar esse direito, uma vez que há diferença entre o legal e o real. Pois, embora seja uma ferramenta importante, a legislação, sozinha, não é capaz de promover mudanças estruturais no país. Apenas a união de todos - governo, Parlamento, Judiciário, sociedade civil a e iniciativa privada - poderá desencadear um amplo processo de reestruturação do Estado democrático.


EDSON SANTOS é deputado federal (PT-RJ) e ex-ministro da Igualdade Racial.


Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/opiniao/mat/2011/06/13/outra-opiniao-identidade-com-cor-924677982.asp#ixzz1PEOiKDNG © 1996 - 2011. Todos os direitos reservados a Infoglobo Comunicação e Participações S.A.



OPINIÃO DO JORNAL -  O GLOBO : Um falso atalho


Publicada em 13/06/2011 às 19h36m


Quase sempre, em assuntos intrincados, as soluções aparentemente mais fáceis, baseadas em ideias derivadas do rasteiro senso comum, são as erradas. E, se estiverem embaladas em ideologias, mais ainda. O grande exemplo no Brasil dos últimos oito anos é a política de cotas raciais, de cunho discriminatório pernicioso, porém azeitada por argumentos "do bem". Como acontece nessas situações, este tipo de política se fundamenta em fatos verdadeiros, manejados para justificar equívocos.
Não se discute que o Brasil, além de ter sido o último a abolir a escravidão, nada fez para a sociedade do século XIX absorver os ex-escravos - não mais como força de trabalho cujo custo para os donos era a manutenção dela fisiologicamente viva, mas como cidadãos. Faltaram educação e treinamento, políticas inclusivas, como se diz. Sobre este passado, constrói-se a tese da "reparação histórica". Edifica-se a ideia de uma "reparação", cujo resultado é, mais de 120 anos depois da Abolição, dificultar o acesso ao ensino superior e ao emprego público do pobre de pele clara e baixa instrução.
Funciona, aqui, o mecanismo da enganosa simplicidade de coisas complexas. O senso comum não considera que negros também eram senhores de escravos no Brasil. Mercadores, inclusive. Nem que a "mercadoria" era capturada na África por outros negros, de tribos inimigas, e vendida a "comerciantes", num abjeto negócio. Tampouco leva em conta a diferença visceral entre a escravidão no Brasil e nos Estados Unidos - de onde a ideologia de sustentação da política de cotas, das "ações afirmativas" foi importada. Qualquer subjugação do ser humano é repulsiva, mas, enquanto houve miscigenação no Brasil - uma virtude da sociedade brasileira, nos últimos anos sob ataque racialista -, os Estados Unidos se constituíram sobre o conceito inaceitável de "raças". Se muitos negros não ascendem socialmente no Brasil não é pela cor da pele. É pela má qualificação determinada pela pobreza. Também o branco pobre enfrenta as mesmas barreiras.
O Rio de Janeiro deu o primeiro passo nas cotas raciais para o ensino superior, na universidade do estado (Uerj). Há pesquisas indicando que os cotistas apresentam, em alguns casos, melhor rendimento que não cotistas. Pode ser, mas continua inaceitável um jovem tomar a vaga de um outro jovem apenas devido à cor da pele. Há pouco, o governo fluminense decidiu dar mais um passo e instituiu a cota no emprego público - dispositivo existente no projeto do Estatuto da Igualdade Racial, em tramitação no Congresso. A parcela de 20% das vagas estará reservada a negros e índios. Rende votos, é politicamente correto. E a questão do emprego e do ensino continua para ser equacionada. É grave quando o mérito passa para segundo plano, não importa por qual motivo: partidários, ditos sociais, étnicos, quais sejam. Afastar jovens do ensino superior ou pessoas do mercado de trabalho no setor público por não serem "negros", "pardos" ou "índios" é injetar na sociedade o veneno do racismo. Funciona ao contrário do que pregam ideólogos do racialismo. Se o "Estatuto" virar lei federal, cumprirá esta função com eficiência.
Enquanto isso, a única "ação afirmativa" desejável, a melhoria do ensino público básico e profissionalizante, forma adequada para qualificar o jovem de famílias de baixa renda, sem discriminações racistas, continua um alvo em horizonte longínquo. Mas as "cotas" garantem votos para já.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/opiniao/mat/2011/06/13/nossa-opiniao-um-falso-atalho-924677922.asp#ixzz1PENftoDk
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7 de jun. de 2011

Governo do Rio aprova cotas para negros e índios em concursos estaduais

 
1ª Conquista!
Vitória!



              O decreto foi assinado na segunda-feira (6) e começa a valer dentro de um mês. A partir de agora, 20% das vagas dos concursos estaduais serão reservadas para índios e negros. O Rio será o terceiro Estado brasileiro a adotar o sistema. Veja os detalhes.












RJTV 2ª Edição
Segunda-feira, 06 06/2011 O governador Sérgio Cabral assinou o decreto no Palácio Guanabara nesta segunda-feira (06). Mesmo optando pelo sistema de cotas, o candidato precisa obter a nota mínima, exigida a todos os participantes do concurso





MATÉRIA DO JORNAL " O DIA " DE 7 DE JUNHO DE 2011.

Negros e índios terão 674 vagas no estado neste ano
Medida que reserva 20% das chances em concursos para esses grupos entra em vigor em julho. Basta se autodeclarar na inscrição
POR ALINE SALGADO
Rio - Todos os concursos públicos estaduais contarão, a partir de 7 de julho, com reserva de 20% das vagas para candidatos que se autodeclararem negros ou indígenas. A medida, assinada ontem pelo governador Sérgio Cabral, já recairá sobre, pelo menos, 674 das 3.368 oportunidades em oito seleções já anunciadas para acontecerem neste ano no estado.
Entre os órgãos com concursos previstos, estão: Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase), com previsão de 1.230 vagas; Polícia Civil, com 854; Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, 650; Polícia Militar, 490; Procon, 181 chances; Ministério Público do Estado, 178; Secretaria de Fazenda, 30; e Tribunal de Contas do Estado, 25.
O decreto se insere em conjunto de medidas a serem implementadas ao longo de 2011, instituído Ano Estadual das Populações Afrodescendentes e das Políticas de Promoção da Igualdade Racial. “Preconceito é o que há de pior e nós estamos combatendo esse mal com política séria, voltada para a igualdade racial. Agora, com certeza, teremos mais professores, procuradores, defensores e outros profissionais negros”, afirmou o governador no ato de assinatura do decreto.
Ministra-chefe da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Luiza Helena de Bairros destacou ainda o posicionamento do estado na vanguarda das ações afirmativas. “O Rio é exemplo para que outras iniciativas se espalhem pelo Brasil e contribuam para reduzir as desigualdades”, disse.
‘Dos 800 defensores, menos de 20 são afrodescendentes’
Secretário de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos, Rodrigo Neves Barreto reforça a ideia de inserir negros em áreas de alta representatividade no governo estadual. “Segundo o IBGE, 51% da população do País é negra e, mesmo assim, a participação deles na alta esfera da Administração Pública é inexpressiva. Na Defensoria, por exemplo, dos 800 defensores, menos de 20 são afrodescendentes. Esta é uma medida histórica”, avalia.
A lei de cotas está associada a outros projetos de inclusão, como o Renda Melhor, para a superação da pobreza extrema, e o programa de treinamento de alunos cotistas da Uerj. “A secretaria vai iniciar, no próximo semestre, um projeto para preparar os universitários para o ingresso na Administração Pública”, antecipou o secretário.
Regras
AUTODECLARAÇÃO
Pelas regras do decreto, candidatos deverão se autodeclarar negros ou indígenas no momento da inscrição no concurso. Caso o participante escolha não entrar no sistema de cotas, ele ficará submetido às regras gerais da seleção.
NOTA MÍNIMA
Para serem aprovados, todos os candidatos — incluindo negros e índios autodeclarados — precisam obter a nota mínima exigida. Se não houver negros ou indígenas aprovados, as vagas das cotas voltarão automaticamente para a contagem geral e poderão ser preenchidas pelos demais participantes da seleção, segundo a ordem de classificação.
NOMEAÇÃO
A nomeação dos aprovados também obedece à classificação geral do concurso. Mas, a cada cinco candidatos aprovados, a quinta vaga fica destinada a um negro ou a um indígena.
VALIDADE
A reserva de vagas terá validade inicial de 10 anos, prorrogável por meio de novo decreto. A cada dois anos, a Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos fará um balanço sobre o resultado do sistema de cotas.
Colaborou Francisco Edson Alves

Pronunciamento do Senador Paulo Paim – PT/RS Cotas no Rio de Janeiro



Pronunciamento sobre a assinatura do decreto que reserva vagas para negros e índios na administração pública do Rio de Janeiro.


Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Senadores,


Quero registrar desta Tribuna o convite que recebi do Governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral e do Superintendente de Igualdade Racial do Estado Marcelo Dias para participar da solenidade de assinatura do decreto que determina 20% de reserva de vagas para negros e índios em concursos na administração pública naquele Estado.

A solenidade acontecerá na próxima segunda-feira, dia 06, às 10 horas no Palácio Guanabara. Como Presidente da Comissão de Direitos Humanos, estarei aqui presidindo a audiência pública sobre o “Dia do Teste do Pezinho”, que é de grande importância para as crianças do Brasil.

Mas quero destacar a iniciativa pioneira do Governador Sergio Cabral, o primeiro Estado que após a assinatura do Estatuto da Igualdade Racial, sancionado em julho de 2010, pelo presidente Lula,  adotará política de cotas na administração pública.

Já tenho informações pela competência do Superintendente de Igualdade Racial, o advogado, Marcelo Dias que outras ações serão desenvolvidas em prol da comunidade negra.

Senhoras e Senhores Senadores,

Para avançarmos com qualquer política pública no país, não basta somente às leis, como o Estatuto da Igualdade Racial, da Criança do Adolescente, do Idoso, da Juventude, do Índio, das Mulheres.

 O essencial é vontade política como teve o Governador Roberto Requião, hoje Senador,  no Estado do Paraná, criou a reserva de vagas de 10% para negros no Estado Paraná antes mesmo da aprovação do Estatuto da Igualdade Racial.

O Rio de Janeiro que foi pioneiro na reserva de vagas para negros, indígenas e alunos de escolas públicas na UERJ e viu a iniciativa se multiplicar para mais de 100 instituições públicas do país e no Prouni. Novamente vem dar o exemplo.

Tenho certeza, que governadores de diversos Estados podem seguir o exemplo do Governador Sergio Cabral, que sempre escuto ser o principal articulador do Pronasci - Programa Nacional de Segurança com Cidadania e agora passará a se destacar pela aplicabilidade do Estatuto da Igualdade Racial que trata de temas como:

Direitos Fundamentais, Direito a Saúde, Direito a Educação, á Cultura, Ao Esporte e ao Lazer; do acesso a terra; da moradia adquada; do trabalho; dos meios de comunicação; do sistema nacional de promoção da igualdade racial; do financiamento as iniciativas de promoção da igualdade racial, das ouvidorias permanentes e do acesso a justiça e a segurança.

Pode ter certeza Governador Sergio Cabral e  Marcelo Dias que eu daqui da tribuna do Senado Federal e o ex Senador Abdias do Nascimento lá dos céus estamos aplaudindo está iniciativa.

Oxalá,

Todos os Governadores sigam o exemplo!

Muito obrigado!      

Era o que tinha a dizer.
Sala das Sessões, 03 de junho de 2011.

Senador Paulo Paim

6 de jun. de 2011

Rui Barbosa evitou banco para indenizar ex-donos de escravos

Enviado por Míriam Leitão - 05.06.2011| 06h01m




     Esta imagem ilustra a coluna de hoje, "Tropeço na História", com um quadro que está em exposição na Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro. Lembra uma decisão importante que o então ministro da Fazenda tomou, ao recusar pedido para a criação de um banco para indenizar ex-donos de escravos. Eles queriam receber dinheiro para compensar os "prejuízos" da Lei 13 de maio de 1888, que aboliu a escravidão. "Mais justo seria indenizar ex-escravos", respondeu Rui, ao negar o pedido. 


COLUNA NO GLOBO

CONVITE COTAS NEGROS E ÍNDIOS - Liderança includente​: A dignidade pelo trabalho

 
Prezad@s Companheiras e companheiros da luta pela Promoção da Igualdade Racial no Rio e no Brasil.
A luta contra o racismo e pela conquista da igualdade e reparações para o nosso povo, aos poucos mas ininterruptamente, vem evoluindo com a nossa continuada luta por inclusão social e racial.
Elencamos somente algumas conquistas recentes:
Em 2001 conquistamos pela primeira vez em nosso país o Sistema de Cotas para uma Universidade Pública, através do pioneirismo na UERJ. Em 2003, sob a liderança do Presidente Lula, foi a vez da criação da SEPIR, o nosso Ministério da Promoção da Igualdade Racial, hoje dirigido pela Ministra Luiza Bairros e, também, a lei 10.639/03, de obrigatoriedade do ensino da África e da Cultura Afrobrasileira na educação. Hoje alterada pela lei 11.645/2008, para inclusão do ensino das culturas e línguas indígenas na rede pública e particular.
Em 2007 o Governador Sergio Cabral criou a Superintendência de Igualdade Racial – SUPIR e em 2009, tombou e transformou a Capoeira em patrimônio imaterial assim como retomou o Presente de Yemanjá, em respeito às religiões de matrizes africanas, nas barcas da Baía de Guanabara.
Quando Presidente da ALERJ homologou a criação do Conselho Estadual dos Direitos do Negro – CEDINE e, recentemente, resgatou e estruturou as homenagens ao herói Zumbi dos Palmares, no programa “Agenda Única Rio Zumbi”.
Em 2010, foi à lei 12.288, da criação do Estatuto da Igualdade Racial, também, no Governo do Presidente Lula e da SEPIR, coordenado pelo Ministro Elói Ferreira e concebido pelo Senador Paulo Paim.
Hoje, estamos diante da redescoberta do Cais do Valongo, por onde aportaram centenas de milhares dos nossos ancestrais escravizados e comercializados, o qual intitularemos Memorial da Diáspora africana.
Estamos, ainda, neste momento, diante de mais uma conquista que é a criação do Sistema de Cotas para reserva de vagas para negros e índios nos próximos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos no Estado do Rio de Janeiro, cujo programa se intitulará "Senador Abdias do Nascimento".
Pela primeira vez na história do Estado do Rio de Janeiro o Governo reconhece os povos indígenas para ocupar cargos públicos que há décadas vem sendo reivindicado.
Os indígenas desse País continuam a luta de CUNHAMBEBE, líder da confederação dos Tamoios.
Dia 06 de junho, segunda, às 10h no auditório do prédio anexo ao Palácio Guanabara, estaremos reunidos na antiga residência da Princesa Izabel para dizermos não à Farsa da Abolição mas, dizermos SIM a esse programa de INCLUSÃO!!!
É neste contexto que o CEDINE e a SUPIR, com os seus pares públicos e da sociedade civil, se organizam, incansavelmente, na busca da tão sonhada e possível "Promoção da Igualdade Racial no Rio e no Brasil".
 Este é mais um passo dos vários necessários para construirmos um RIO SEM RACISMO, POIS IGUALDADE RACIAL É PRA VALER.
E, assim, concluímos agradecendo a sua confiança, a do jovem Secretário Rodrigo Neves e a desse líder includente, Governador Sergio Cabral e equipe.
“2011, ANO MUNDIAL DO AFRODESCENDENTE, ESTABELECIDO PELA ONU”
Parabéns Rio! Parabéns Brasil!. Valeu Zumbi!!
Obrigado Senador Abdias do Nascimento!!! Presente!!!

Paulão Santos - Presidente  do CEDINE
Marcelo Dias - Superintendente da SUPIR
Arão Guajajara – Líder indígena e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/RJ

2 de jun. de 2011

Ministros e ativistas discutem combate à discriminação racial⁠

Ministros e ativistas discutem combate à

discriminação racial

“Há um grande preconceito contra a comunidade negra, que se esconde sob a capa da cordialidade.” A afirmação foi feita pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Ari Pargendler, ao abrir nesta segunda feira (30) o encontro “Comunidade Negra e a Justiça no Brasil”, promovido pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) e pela organização não governamental Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro).

Segundo o presidente do STJ, a comunidade negra – “escravizada e depois usada como mão de obra barata” – ainda não se libertou completamente. “Há um caminho muito longo a percorrer e o STJ, pelos seus ministros e servidores, está engajado nessa luta”, disse Pargendler.

Ele reconheceu que, nos próprios quadros do Tribunal, “a comunidade negra não está representada como na sociedade”. No Brasil, segundo o IBGE, os negros são 50,8%. “No STJ, nem chega perto disso”, afirmou, comentando que os brancos se beneficiam de “vantagens comparativas” na hora de fazer um concurso público, por conta do nível de renda mais alto, que proporciona melhores condições de ensino.

O encontro, realizado na sala de conferências do STJ, foi articulado pelo diretor-geral da Enfam, ministro Cesar Asfor Rocha, e pelos dirigentes da Educafro – rede comunitária de cursinhos pré-vestibulares sem fins lucrativos e com marcante atuação política na luta contra a exclusão social. O objetivo foi discutir a participação do Poder Judiciário na construção de uma verdadeira democracia racial.

“Não me recordo de outro evento como este no Tribunal. É o primeiro encontro com o intuito de defesa da cidadania negra”, afirmou o ministro Benedito Gonçalves, que é negro e foi designado para coordenar o encontro. Outro afrodescendente com alto posto na magistratura nacional, o ministro Carlos Alberto Reis, do Tribunal Superior do Trabalho, também participou do encontro.
Cerca de 120 pessoas, em grande parte militantes do movimento negro, lotaram a sala de conferências. Dez ministros do STJ e dirigentes de algumas escolas estaduais de magistrados prestigiaram o evento.

A secretária de Políticas de Ações Afirmativas do governo federal, Anhamona Silva de Brito, apresentou dados sobre a discriminação racial no Brasil para defender a reflexão dos poderes públicos sobre essas questões e propôs a inclusão do problema racial no conteúdo dos cursos de formação de magistrados.

A defesa das cotas para afrodescendentes nas universidades públicas foi o principal ponto destacado pelos representantes do movimento negro na luta pela inclusão social. O diretor-executivo da Educafro, frei David Santos, criticou ações judiciais contra o sistema de cotas e pediu que a Justiça observe os tratados internacionais que condenam a discriminação racial.
Para mostrar que “o Poder Judiciário não está fugindo do seu papel”, o ministro Luis Felipe Salomão apresentou um levantamento sobre a jurisprudência do STJ com 22 decisões favoráveis à legalidade e constitucionalidade das políticas de cotas. Em uma delas, em que o relator foi o ministro Felix Fischer (atual vice-presidente do Tribunal), a Quinta Turma considerou que uma lei estadual do Paraná, prevendo cota em concurso público, estava de acordo com a ordem constitucional do país.

Ao mesmo tempo, Salomão citou dados que evidenciam a exclusão: 98% dos cargos do Poder Judiciário, 95% das cadeiras na Câmara dos Deputados e 97% no Senado Federal são ocupados por brancos – os quais também ocupam 95% das vagas de professor universitário. O ministro revelou que no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, nos últimos cinco anos, foram julgados apenas nove casos de discriminação, com três condenações.

Questionado sobre possível abrandamento no tratamento dado pela Justiça aos crimes de racismo, que em muitos casos passaram a ser tratados apenas como injúria, o ministro Felix Fischer afirmou que a questão não diz respeito somente à jurisprudência dos tribunais, mas à lei. “Houve uma alteração na legislação, creio, para evitar justamente uma interpretação muito benevolente, que desqualificava o crime para injúria no caso de ofensa direta à pessoa”, explicou o ministro.

Com a nova lei, de 2003, a injúria de natureza racista passou a ter pena mais severa. Segundo Felix Fischer, a mudança não deixou a situação mais favorável ao ofensor, apenas evitou que sua conduta fosse considerada injúria simples, com o que a pena seria muito branda. Já os crimes de preconceito contra a comunidade negra ou outras etnias continuam sendo punidos com base na Lei n. 7.716/1989.

Também acompanharam o encontro os ministros do STJ Humberto Martins, Napoleão Nunes Maia Filho, Sidnei Beneti, Raul Araújo, Paulo de Tarso Sanseverino e o desembargador convocado Vasco Della Giustina.

Foto - Seminário contou com a participação de ministros do STJ
Coordenadoria de Editoria e Imprensa
30/05/2011 - 19h56
http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=102033